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quinta-feira, 5 de abril de 2012

CONTROLE DA NATALIDADE - AS PILULAS ANTICONCEPCIONAIS E O DIU EM DISCUSSÃO NACIONAL

Revista Manchete 9 de dezembro de 1978

MEDICINA                                                        
                                                                             O médico Paulo Belfort



Em Salvador e Porto Alegre os anticoncepcionais e os dispositivos intra-uterinos – particularmente o DIU – foram temas que provocaram acirradas discussões, na última semana. Na capital baiana o debate de quatro dias, durante o Congresso Brasileiro de Ginecologia,(Foto 1) reunindo três mil médicos brasileiros e estrangeiros, estendeu-se depois num programa de televisão, com a presença do ministro da Saúde, Almeida Machado. O ministro, então, criticou os médicos que utilizam dispositivos anticoncepcionais, afirmando que já há quinze anos a importação e o uso do DIU foram considerados ilegais no país. O ex-presidente da Federação Brasileira de Ginecologia, Paulo Belfort, atacou o Programa de Prevenção de Gravidez de Alto Risco, como sendo contraditório e incompreensível, pois pretende evitar o crescimento demográfico através de pílulas anticoncepcionais, fornecidas as gestantes sem condições de adquiri-las. Afirmou ainda: atrás dessas campanhas de combate aos anticoncepcionais existe um falseamento deliberado da verdade, pois as pessoas radicalmente contrárias assumem sempre posições políticas e não médicas. O controle da natalidade é consequência da autodeterminação do indivíduo em seu planejamento familiar e só pode ser alcançado com o desenvolvimento e a melhor distribuição de renda. Paulo Belfort, no entanto, acredita serem os anticoncepcionais menos nocivos que a gravidez indesejada, dizendo ser o aborto mais mortífero do que as pílulas. O médico Jaime Souto defendeu tese semelhante quanto ao uso do DIU. Em sua opinião, deve ser feita uma pesquisa séria quanto às conveniências do uso desse dispositivo. Justificou-se afirmando ter o DIU indicações até mesmo terapêuticas, como na síndrome de Arsheim (colocamento das paredes uterinas) e nas pacientes que necessitam evitar filhos, mas não podem usar pílulas anticoncepcionais. Na opinião da maioria dos médicos participantes, os resultados do Congresso Brasileiro de Ginecologia e Obstetrícia foram excelentes, pois trataram de vários temas ligados à medicina, e também de outros relacionados ao mesmo campo, como o da criação de programas assistenciais às populações rurais com a ajuda de estudantes de medicina na programação familiar.

Repercussão. Foi um programa de televisão que desencadeou em Porto Alegre uma acalorada polêmica sobre o uso do DIU. Um médico carioca e sua cliente, que utilizou o dispositivo anticoncepcional, afirmaram ser este altamente abortivo. Acusaram ainda os médicos defensores desse processo de “criminosos”, pois matam os fetos indiscriminadamente. A polêmica tomou vulto ao se revelarem as declarações do ministro da Saúde, Paulo de Almeida Machado, chamando a atenção da população para os perigos do uso do DIU, método considerado perigoso e ilegal. Mas outros médicos entrevistados afirmaram desconhecer qualquer determinação legal contrária á colocação do DIU. Eles desejaram saber por que esse dispositivo continua então a ser importado pelo país. Outro aspecto que, segundo eles, causa espanto é a afirmação de que o dispositivo intra-uterino é abortivo, portanto, duplamente ilegal. Perguntado sobre a responsabilidade da Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul, quanto à fiscalização ao DIU, o secretário substituto, Salzano Vieira da Cunha, disse só ter tido conhecimento da ilegalidade do dispositivo após as declarações do ministro da Saúde. Segundo Viera da Cunha, a secretaria não distribui nem incentiva o uso de qualquer anticoncepcional. No entanto, ele reconhece haver no Programa de Planejamento Infantil, do Ministério da Saúde, um item tratando do DIU, apresentando-o juntamente com os demais anticoncepcionais. O médico gaúcho Arnaldo Ferrari, responsável pela Fundação de Endocrinologia e Fertilidade, alegou desconhecer qualquer restrição legal à colocação de dispositivos intra-uterinos e acredita serem estes os melhores métodos contraceptivos, dividindo com as pílulas hormonais a preferência, tanto dos médicos quanto da população. Finalizando, a Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul, através de seu secretário substituto, acaba de fazer consulta ao Ministério da Saúde a fim de tomar providências oficiais quanto ao uso do DIU. Mas as críticas maiores dos médicos gaúchos dirigiram-se ao seu colega carioca. Em sua opinião, as afirmações categóricas contra o uso do DIU por ele levadas ao debate televisionado, causaram intranquilidade nas mulheres que usam o dispositivo. Tal assunto, tratado fora dos consultórios ou dos congressos específicos, torna o caso uma questão de quebra de ética profissional.

(Reynivaldo Brito/Salvador e Bernardete Schmitt/Porto Alegre)

                                     

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